quarta-feira, 13 de março de 2013

"E NO ENTANTO SE MOVE"

Península Ibérica à noite, foto pela Wordpress


Pelas imagens do satélite, via Internet, vejo a noite se aproximando da nossa porção ocidental da terra, sinto seu movimento lento, quase implacável, eu diria. Mas em termos mais precisos, nós, nossa aldeia, a casa onde vivemos, é que estamos caminhando, inadiáveis, para ela. Logo folgaremos, temporariamente, do sol, mergulhando, uma vez mais, na sombra imemorial do universo.

Visto assim, de fora, nosso planeta é  fundamentalmente belo. Ou melhor, a terra é, sob qualquer abordagem, bela,  porquanto uma criação de deuses, uma vontade de um Deus, ou um feliz acaso brotado do caos cósmico.

Mas na perspectiva de um satélite, à distância, ela assume uma leveza, quase uma fragilidade, no inimaginável alcance do cosmo. Imagino os grandes gênios da astronomia - Copérnico, com a teoria heliocêntrica , Kepler e sua descoberta das órbitas elípticas dos planetas, Galileu, com a sua lendária afirmação “Eppur si muove” - assistindo  a esse espetáculo disponibilizado a um cidadão comum pela Google Earth, um programa de computador que apresenta modelos tridimensionais do globo terrestre, visualizações da lua e de Marte e outros planetas, permitindo até nossa "navegação"  pelo universo.   

O que mais me atrai a atenção nessas imagens, é o movimento da sombra, como se eu estivesse assistindo a uma tempestade se aproximando. Mais que isso, ainda, é ver ali estampado, quase palpável, o nosso velho sono de cada dia.  Na África do Sul  já é noite neste momento, e a sombra se acerca do Atlântico oriental. Logo, dentro de 4 ou 5 horas, estará batendo à minha casa, responsável e pontual. Eu a deixarei entrar e a espantarei com  luzes, como sempre.

Essa escuridão “ambulante” vista na tela de meu computador abre para mim uma outra dimensão, dilui uma certa angústia do que não vejo, do que não se revela. Contemplá-la por uma ótica afastada da terra possibilita-me uma outra relação com opostos de luz e sombra que tantas vezes gritam dentro de nós.  E, sobretudo, poder mudar as posições do globo e ver que no Japão é a manhã que agora se aproxima traz-me um grande alívio.

Nesta era da virtualidade, assediada por imagens, até a noite,  vista e transmitida por aparelhos  de satélites, adquire o status de    celebridade, embora cumpra apenas seu diário, intransferível ofício de nos trazer nosso outro lado, o inconsciente, de nos lembrar a gênesis envolta em mistério, o barro etéreo, ainda indecifrável,  de que fomos criados.

Fernando Campanella

Youtube THE SOUND OF COSMOS, Alpha, enviado por TheSoundOfCosmos